Mato Grosso tem 135 brigadas contra incêndios florestais
O mapeamento tem como objetivo auxiliar na resposta rápida ao fogo para evitar a destruição da floresta e da vegetação nativa no estado
Antes mesmo de o Pantanal ter tempo para se recuperar de 2020, o fogo avançou novamente sobre a sua vegetação. As bocaiuvas, os jatobás e os jenipapos que cresciam após o ano histórico de queimadas no bioma voltaram a ser destruídos pelas chamas.
O bioma teve um aumento de 2000% nos focos de calor no primeiro semestre de 2024, em comparação com o mesmo período do ano anterior, de acordo com o monitoramento do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Quase 1,5 milhão de hectares do Pantanal de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul já foram consumidos pelo fogo.
As onças-pintadas, os jacarés e os macacos fazem o que podem para tentar escapar da morte. As carcaças dos que não conseguem são encontrados dias depois pelas equipes de resgate. O fogo pode até ter causa natural, mas os estudos apontam que eles estão cada vez mais ligados às atividades humanas.
Nesse contexto, é fundamental identificar as iniciativas que buscam prevenir e combater o fogo. Em Mato Grosso, o mapeamento das brigadas de prevenção e combate aos incêndios florestais é elaborado pelo Instituto Centro de Vida (ICV) e está em sua 4ª edição.
O analista socioambiental do Programa de Transparência e Justiça do ICV Marcondes Coelho destacou que as respostas rápidas ao fogo têm potencial de evitar a destruição da floresta e da vegetação nativa no estado.
O mapeamento é muito importante para a gente conhecer a distribuição dessas brigadas pelo estado, saber qual região está mais assistida por essas equipes e quais carecem de mais atenção do poder público e até mesmo da sociedade, que pode unir esforços nessa causa.
Dados
As brigadas de incêndio podem ser públicas, privadas ou comunitárias. Elas são instrumentos de resposta ao fogo e são compostas por brigadistas contratados ou voluntários. O Corpo de Bombeiros também possui unidades permanentes próprias e instrumentos de resposta temporários, previstos no plano da instituição para a temporada de incêndios em 2024.
Em 2024, foram identificadas 135 brigadas em Mato Grosso. Com relação ao ano anterior, houve um aumento de 14 unidades.
A distribuição das brigadas também foi ampliada. Elas agora abrangem 64 municípios do estado. Ou seja, quase metade dos municípios do estado contam com algum instrumento de resposta ao fogo.
O mapeamento identificou que as brigadas se concentram no Cerrado. Cerca de 50% delas estão distribuídas pelos municípios deste bioma. Cuiabá e Chapada dos Guimarães têm a maior quantidade de unidades, que podem atender todo o estado.
Embora o Pantanal tenha o menor número de brigadas, municípios como Barão de Melgaço (7) e Poconé (5) têm números acima do padrão visto para a maioria, que fica entre 1 ou 2 brigadas.
“O investimento em brigadas na região amazônica deve ser prioridade, considerando que a cada ano a floresta está mais vulnerável ao fogo”, disse Marcondes
Em relação a 2023, houve um aumento no número de Brigadas Municipais Mistas (BMMs), que são uma das estratégias do Corpo de Bombeiros para garantir brigadas em diferentes municípios. Foram criadas unidades nos municípios de Nossa Senhora do Livramento, Santo Antônio de Leverger e Sorriso.
Por outro lado, o número de Brigadas Estaduais Mistas (BEMs) diminuiu em 4 unidades no total geral. Em 2023, eram 29 dessas brigadas. Agora, são 25, com unidades em novos munícipios (Cáceres, Cuiabá, Guarantã do Norte, Juína, Pontes e Lacerda, Rondonópolis e duas em Várzea Grande).
Além disso, 6 municípios passaram a contar com Bases Descentralizadas Bombeiro Militar (BDBMs). Estes municípios são Cocalinho, Confresa, Itiquira, Ribeirão Cascalheira, Novo Santo Antônio e Paranatinga, sendo que os dois últimos passaram a somar duas BDBMs cada. Por outro lado, Pontes e Lacerda não conta mais com essa categoria de reforço.
Outra mudança em relação ao mapeamento do ano passado está relacionada às brigadas do Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais (Prevfogo), vinculadas ao Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Duas brigadas que estavam em Terras Indígenas em 2023 foram desativadas.
No entanto, em 2024, foram criadas seis novas brigadas nesses territórios, localizadas nas Terras Indígenas Alto Xingu, Baía dos Guató, Maraiwatsede, Capoto Jarina e Urubu Branco.
No Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) foi desativada a brigada do Parque Nacional do Juruena, com sede em Alta Floresta. Apesar disso, o município agora passa a contar com a Brigada Florestal Cristalino, criada e financiada pela Fundação Ecológica Cristalino (FEC).
No que diz respeito às Brigadas Comunitárias, a brigada de Gaúcha do Norte foi desativada.
Biomas
Mato Grosso fechou julho com recordes de foco de calor desde 2018. Foram registrados 2.472 alertas, um aumento de 70,13% em relação ao mesmo período do ano anterior. Em comparação com 2020, ano histórico de queimadas no estado, o aumento registrado foi de 2%.
Dessa vez, no entanto, a maior incidência de focos foi na Amazônia. Foram registrados 1.474 focos de calor no bioma, o que corresponde a 60%. Colniza (a 1.039 km de Cuiabá) foi o município que apresentou mais focos, com 537 pontos. Os dados são do Portal de Inteligência Territorial do ICV.
O fogo também avançou por Terras Indígenas. A Federação dos Povos e Organizações Indígenas de Mato Grosso (Fepoimt-MT) estima que ao menos 22 territórios foram atingidos até agora. Foi criada uma campanha para arrecadação de alimentos e de dinheiro para compra de caminhões-pipa.
Além de afetar a saúde dos indígenas, o fogo destruiu casas, comprometeu as roças utilizadas para alimentação e impossibilitou a caça de frutos típicos da floresta. A falta de água em um mês de seca extrema também agravou o cenário.
“Essa situação está afetando gravemente a saúde física e mental de toda a população que vem sendo atingida. Essas perdas causadas pelos incêndios precisam ser reparadas pelos órgãos públicos responsáveis e por todos os que se dispuserem a ajudar”, comentou a federação em publicação.
Causas do fogo
O Brasil ocupa uma posição de destaque em termos de incêndios florestais e é o 3º país com maior ocorrência de focos de queimadas na última década. O MapBiomas Fogo aponta que 23% do território nacional pegou fogo pelo menos uma vez entre 1985 e 2023.
Dados do INPE apontam que a maior parte das queimadas acontecem em áreas de desmatamento recente. Isso indica que os incêndios estão cada vez mais ligados às atividades humanas.
A região de transição entre Cerrado e Amazônia, que cobre boa parte de Mato Grosso, é uma das áreas mais vulneráveis às ações humanas no país. Por ser uma das maiores fronteiras agropecuárias do mundo, essa região se tornou suscetível à degradação. O fogo é um dos vetores mais preocupantes.
Diversos estudos apontam que o desmatamento decorrente das atividades agropecuárias favorece o uso e o avanço do fogo. Em Mato Grosso, 60% das atividades econômicas no estado estão vinculadas ao setor agropecuário, conforme dados do Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea). Isso poderia explicar a liderança do estado no ranking dos focos de calor.
A frequência elevada de queimadas em Mato Grosso, associada à derrubada da vegetação nativa para outros usos da terra, indica que a prática predominante no estado traz muitos riscos. Se a expansão agropecuária não for cuidadosamente gerida, ela pode comprometer a integridade dos nossos biomas, ameaçando não apenas a biodiversidade, mas também os recursos naturais essenciais para a produção das commodities que se destacam na economia do estado.
Como agravante, fenômenos como o El Niño intensificam a seca extrema, que é considerada um dos maiores fatores de risco para os incêndios, pois reduz a umidade do solo e deixa a vegetação mais suscetível ao fogo.
Sob um clima alterado, essas condições extremas potencializam situações desastrosas. O estudo recente do World Weather Attribution (WWA), grupo internacional de cientistas especializados em assuntos climáticos, apontou que as mudanças climáticas provocadas pela ação humana intensificaram em 40% os incêndios no Pantanal em junho deste ano.
Além de destruir habitats naturais e ameaçar a biodiversidade, os incêndios pioram a qualidade do ar e comprometem a saúde pública, afetando milhares de pessoas.
É impactante ver cidades amazônicas, em meio a maior floresta tropical do mundo, atingirem os piores índices de qualidade do ar devido às fumaças dos incêndios. Mais do que impactante, é inaceitável. O poder público tem que garantir a proteção da floresta, o combate aos incêndios e a saúde da população. Tudo está conectado.
Para mais informações sobre o mapeamento, contate brigadas@icv.org.br
Para atendimento à imprensa, contate comunicacao@icv.org.br
As fotografias utilizadas neste storymap são de autoria de José Medeiros e Dayanne Dallicani.
Como fizemos
Para a elaboração do mapeamento, foi imprescindível o apoio e repasse de informações de diferentes instituições públicas e privadas, como também da participação popular.
As informações sobre as brigadas ligadas às instituições públicas, como Ibama/Prevfogo, ICMBio, Funai, Corpo de Bombeiros, foram repassadas via serviços de solicitação de informação ao cidadão.
Para melhor compreensão sobre as brigadas do Corpo de Bombeiros, avaliamos o “Plano de Operações Temporada de Incêndios Florestais 2024”.
Para a localização das unidades permanentes do Corpo de Bombeiros, utilizamos os endereços informados no site da instituição.
Já para as Brigadas Municipais Mistas (BMMs), Brigadas Estaduais Mistas (BEMs), Bases Descentralizadas Bombeiro Militar (BDBMs), adotamos como referência os endereços das sedes das prefeituras municipais naqueles municípios onde essas brigadas temporárias estão previstas pelo POTIF 2024.
As Equipes de Intervenção de Apoio Operacional (EIAOp) foram associadas ao endereço do Batalhão de Emergências Ambientais (BEA).
As brigadas comunitárias foram identificadas tanto a partir do contato com lideranças locais, quanto pela ONG SOS Pantanal, que está desenvolvendo um projeto de apoio e formação de brigadas.
Para identificar as brigadas particulares, contamos com informações novamente da SOS Pantanal e também do Polo Socioambiental Sesc Pantanal.