
Guia de Conduta Ambiental
para empréstimos e investimentos em Soja no Cerrado
O Cerrado e o Desenvolvimento Sustentável brasileiro
O Brasil tem uma oportunidade única para se consolidar como referência em Desenvolvimento Sustentável em uma região crítica para a segurança alimentar global
O Cerrado compõe quase um quarto do território nacional e é a savana mais biodiversa do mundo. Suas inúmeras nascentes fornecem abastecimento para grandes regiões metropolitanas, e em seu solo e vegetação nativa são contidos grandes estoques de carbono - fundamentais para combater as mudanças climáticas. O Cerrado também é uma região econômica de imensa importância: 20% do PIB brasileiro vem do agronegócio e grande parte desta produção ocorre no bioma.
A alternativa livre de desmatamento
O Cerrado possui 18,5 milhões de hectares de áreas já abertas aptas para o plantio de soja. Isso representa mais que o dobro da área total necessária para acomodar as projeções de expansão da área de soja até 2030. Para os produtores, o retorno financeiro das opções de expandir sobre área de pastagem apta para soja ou de converter área de vegetação nativa para o cultivo é quase equivalente. Também há potencial para incrementar a produtividade em até 25% com a implementação de melhores práticas agrícolas.
Como consequência, é possível suprir a demanda global por soja ao mesmo tempo que se conserve a vegetação nativa do Cerrado.
A Soja no Cerrado
Em 2017, uma área de quase 20 milhões de hectares (Mha) do Cerrado correspondeu ao cultivo de soja e outras culturas rotacionais (milho e algodão). Isto representa metade da produção brasileira e 15% da produção global.
Com o contínuo aumento de demanda global por alimentos, acelerados por processos de especulação de terras, a abertura de novas áreas para o plantio de soja pode se manter como um grande fator de desmatamento no Cerrado. O bioma já apresenta menos de 50% de remanescentes nativos preservados . O mapa interativo mostra a área plantada de soja para a safra 2016/17.
Regiões do Cerrado
A expansão da soja se deu de diferentes maneiras no Cerrado, devido à fatores como distância à infraestrutura existente, políticas públicas de ocupação, preço da terra, aptidão edafoclimática, disponibilidade de terras já abertas (pastos), entre outros fatores. São elas: Sul do Cerrado, MATOPIBA e Mato Grosso (ver mapa interativo).
Recursos hídricos
De acordo com a ANA (Agência Nacional de Águas) , a retirada para a irrigação é o principal fator de consumo de água nas bacias. Mapas recentes de balanço hídrico superficial , mostram que algumas áreas irrigadas já estão em condição crítica e a expansão não planejada pode causar grande impacto nos recursos hídricos. Existem 26 Mha do Cerrado em situação crítica ou muito crítica de estresse hídrico. Deste montante, 4 Mha são áreas produtoras de soja. As regiões críticas, sobretudo aquelas com uso extensivo de irrigação, devem ser avaliadas com cuidado para expansão futura da soja. Os marcadores a seguir destacam algumas áreas irrigadas que podem apresentar déficit hídrico devido a atividade agrícola.
O papel dos incentivos financeiros:
À medida que cresce a pressão internacional e doméstica para tornar as cadeias produtivas livres de desmatamento, o aumento de capital direcionado à produção de soja livre de desmatamento (DCF) pode gerar benefícios para atores ao longo de toda a cadeia de valor. Oportunidades de negócios e benefícios reputacionais são gerados conforme o setor se alinha com essa agenda. Traders podem criar relacionamentos contratuais mais longos com produtores e melhorar o acesso a mercados mais exigentes ao adotar requisitos ambientais mais estritos. Produtores também podem acessar melhores condições de financiamento e evitar a perda de produtividade atribuída aos efeitos do desmatamento regional. Com melhores informações disponíveis para os tomadores de decisão, os povos tradicionais do Cerrado serão respeitados ao direcionar a expansão da área de soja para pastagens subutilizadas, respeitando a diversidade cultural e social dos territórios.
A Consulta
Conversamos com diferentes atores envolvidos na produção de soja para chegar à um guia de referência para qualquer financiador da cadeia de valor da soja que queira criar ou adaptar suas linhas de crédito com objetivo de zero desmatamento ou conversão de vegetação nativa. Foram eles:
Um guia de conduta ambiental para organizações que financiam a produção de soja
O Guia de Conduta Ambiental da The Nature Conservancy foi criado para guiar qualquer organização que queira criar ou adaptar seus mecanismos financeiros para uma abordagem livre de desmatamento (DCF). Ele contém uma lista de requerimentos e protocolos de monitoramento para que sua adoção seja efetiva, garantindo que a produção DCF aconteça de maneira prática e que produtores e investidores possam implementá-lo.
"Pode parecer um paradoxo, mas há evidências de que manter a vegetação nativa evita dias de extremo calor e as consequentes quedas de produtividade"
Anna Lucia Horta - Gerente de Negócios e Investimentos da TNC
Critérios para criar um produto livre de desmatamento
O Guia de Conduta Ambiental requer que credores e investidores incorporem os requisitos essenciais listados a seguir em seus instrumentos financeiros:
- Conformidade com a legislação em todas as suas propriedades (leis ambientais, de trabalho, não apresentar sobreposição com unidades de conservação, etc);
- Data de referência para não desmatamento - que sugerimos que seja Janeiro de 2018;
- Irrigação - apresentar outorga e avaliar o estresse hídrico previsto em sua região.
Indo além deste mínimo necessário, incluir elementos adicionais nos mecanismos financeiros podem gerar ainda maior impacto ambiental positivo. São eles:
- Aplicação dos requerimentos em todas as propriedades;
- Priorização espacial;
- Inexistência de conflitos de terra;
- Boas práticas agrícolas;
- Indicadores de desempenho do IFC.
A customização para além dos requerimentos essenciais permite o gerenciamento da carteira para o alcance de metas institucionais mais ambiciosas em termos de impacto ambiental ou até aplicar uma abordagem mais conservadora para minimizar exposição aos riscos ambientais. Os elementos adicionais podem ser integrados como obrigatórios em um programa de empréstimos, por exemplo, ou podem ser encorajados por meio de acesso preferencial ao mecanismo financeiro para produtores que os sigam e até por meio de incentivos financeiros como menores taxas de juros e outras condições mais favoráveis para o financiamento.
Aonde devo direcionar meus recursos para ter o maior impacto ambiental positivo?
A The Nature Conservancy identificou 139 municípios com alto valor de conservação, destacados no painel (Dashboard) abaixo. São regiões em que há estoque de pastagem apta para soja, com risco significativo de desmatamento e em que a produtividade atingível é suficiente para que a produção de soja seja economicamente viável. Também são regiões que já produzem soja, para não estimular a ida da soja para onde não há atividade produtiva e potencialmente criar novos polos de desmatamento.
A TNC classificou as áreas abaixo em três classes de prioridade para direcionar os mecanismos financeiros para expansão da soja livre de desmatamento: média (amarela), alta (verde claro) e mais alta (dark green). Entretanto, o painel permite que o usuário analise as características de qualquer município no Cerrado para determinar sua relevância de acordo com a estratégia de cada organização. Confira a aba "como usar" no painel para interpretar os dados e consultar fontes.
Como monitorar?
O Guia também oferece orientação sobre protocolos de monitoramento e verificação para os financiadores, auxiliando a diagnosticar procedimentos internos que garantam a conformidade com os requisitos ambientais acordados em contrato e fortalecendo as políticas de transparência. O processo é composto por cinco etapas (prospecção ativa, conferência de elegibilidade, preparação para monitoramento, monitoramento anual e supervisão contínua) e inclui listas da documentação sugerida e/ou evidência para atender à cada requerimento.
Você pode acessar o relatório completo com o protocolo de monitoramento aqui .
Emissão de Carbono Evitada
Financiar expansão de soja exclusivamente sobre área de pastagem provavelmente irá alterar o padrão esperado de conversão de uso do solo em qualquer município do Cerrado. A The Nature Conservancy desenvolveu um modelo espacialmente explícito em que se pode prever, com 85% de confiança estatística, a emissão de dióxido de carbono associada ao desmatamento esperado para cada município do Cerrado. Simule!
The Nature Conservancy - clique aqui para maiores informações sobre a calculadora.
Consideração Final
Há crescente interesse de diversas partes na produção de soja no Cerrado para que a expansão futura da área de soja aconteça de maneira livre de desmatamento. Mecanismos financeiros que estão emergindo para auxiliar produtores a expandir sua área de soja sobre áreas já abertas e focados em aumento de produtividade podem exercer papel fundamental nessa transição. O Guia de Conduta Ambiental oferece orientações práticas para auxiliar instituições financeiras a desenhar e implementar esse tipo de programa e financiar o crescente mercado global de soja enquanto evita a conversão de 2,2 milhões de hectares de vegetação nativa do Cerrado na próxima década.
Reconhecimentos
A criação do Guia de Conduta Ambiental só foi possível graças ao envolvimento de muitos indivíduos e organizações.
Clique para saber mais sobre o trabalho da TNC no Brasil e o relatório de 2019 sobre os incentivos para a produção de soja sustentável no Cerrado .
Este projeto é financiado pela Gordon e Betty Moore Foundation.